segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Márcio Cecchettini, condenado novamente! "Por ser do PSDB não vai preso"

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE FRANCO DA ROCHA
FORO DE FRANCO DA ROCHA
2ª VARA CÍVEL
PÇA. MINISTRO NELSON HUNGRIA, 01, Franco da Rocha-SP - CEP
07850-900
Horário de Atendimento ao Público: das 12h30min às19h00min



SENTENÇA
Processo Físico nº: 0011763-11.2008.8.26.0198
Classe – Assunto: Ação Civil de Improbidade Administrativa
Requerente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Requerido: Marcio Cecchettini e outro


Juiz(a) de Direito: Dr(a). Thais Caroline Brecht Esteves Fischmann


Vistos.


O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO ajuizou a presente Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa em face de MÁRCIO CECCHETTINI e ADIOVALDO APARECIDO DE OLIVEIRA, alegando, em síntese, que os réus praticaram ato de improbidade administrativa consistente na solicitação pelo Réu Adiovaldo, então Presidente da Câmara Municipal em outubro de 2005, da compra de um veículo com características determinadas e na abertura, processamento e homologação da licitação realizadas pelo corréu Márcio. Aduz o Ministério Público que as características descritas na solicitação e no processo licitatório foram realizadas com o fim de favorecer determinada montadora e sua concessionária local. Pretende, pois, a condenação dos réus às penas de improbidade administrativa, com a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05 (cinco) anos, o pagamento de multa civil de 100 (cem) vezes o valor da remuneração percebida e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de 03 (três) anos. Com a inicial vieram os documentos de fls. 13/322.

O réu Márcio, devidamente notificado, apresentou sua defesa preliminar as fls. 328/330, acompanhada de procuração de fl. 331.

O ré Adiovaldo, também notificado, manifestou-se em defesa preliminar as fls. 333/344, juntando a procuração e os documentos de fls. 345/454. 

O Ministério Público manifestou-se as fls. 459/460 e 463/464. Incidente de suspeição (fls. 477/478).
A inicial foi recebida (fls. 483/485). O Réu Márcio, citado, apresentou defesa as fls. 498/512, acompanhada dos documentos de fls. 513/595, arguindo preliminares de nulidade do procedimento ante a inaplicabilidade da Lei de Improbidade contra agentes políticos e denunciação da lide da General Motors do Brasil e Francovel Veículos Ltda. No mérito, afirma que não houve favorecimento de concorrente e que as especificações técnicas atendiam as necessidades da Presidência da Câmara, batendo-se pela legalidade de todo o processo licitatório. Aduz a ausência de dolo em sua conduta e pugna, pois, pela improcedência da ação.

Há réplica as fls. 603/614.

O Réu Adiovaldo, igualmente citado, apresentou contestação as fls. 616/624, explicando a origem da necessidade para compra do veículo e a regularidade do processo licitatório, afirmando inexistir afronta aos princípios da administração ou ato de improbidade administrativa. Enumera os benefícios da aquisição do veículo através de concessionária local e aduz que o valor da aquisição estava abaixo do valor de mercado. Questiona o controle do ato pelo Poder Judiciário e pelo Tribunal de Contas.

Requer a improcedência da ação.

Por ocasião do saneamento do feito, foi decretada a revelia do corréu Adiovaldo e afastadas as preliminares de nulidade do processo e denunciação da lide arguidas pelo corréu Márcio em sua contestação. No ato, foi ainda determinada a produção de prova documental e indeferidas a produção de prova oral e pericial (fls. 666/667).

Há agravo retido as fls. 676/679 e contraminuta as fls. 686/693.

Os ofícios foram respondidos.

O Ministério Público apresentou seus memoriais as fls. 790/797 e os réus quedaram-se inertes.


Vieram-me os autos para sentença.

É o relatório.

Fundamento e DECIDO.

De fato a solução da controvérsia prescinde da produção de outras provas além daquelas já constantes nos autos, de modo que o julgamento do feito impõe-se como medida de rigor, eis que devidamente afastadas as preliminares arguidas.

Em pese os contornos que a lide ganhou, seu desfecho é de simplicidade acadêmica.

Os pedidos vestibulares derivam de um único fundamento: a exigência de características para aquisição de veículo, que limitariam a concorrência e direcionariam a empresa vencedora em procedimento licitatório na modalidade de carta convite.

Tanto os documentos trazidos pelas partes como suas alegações tornaram incontroverso nos autos que o Município de Franco da Rocha, com a autorização e anuência de seu então Prefeito, ora Réu, Márcio Cecchettini, realizou processo licitatório na modalidade de carta convite sob o nº 69/2005 para a aquisição de um veículo para uso da Presidência da Câmara Municipal, conforme solicitação subscrita pelo então Presidente da casa legislativa local, ora Réu, Adiovaldo Aparecido de Oliveira.

O veículo, segundo consta da solicitação, seria adquirido pelo Executivo Municipal e doado ao Legislativo Municipal que, por sua vez, pagaria ao primeiro o valor recebido a título de indenização por sinistro pela perda total de veículo antigo, o que correspondia à época ao valor de R$ 38.299,80, saldando a diferença com o desconto da suplementação orçamentária a que teria direito pelo excesso de arrecadação municipal no exercício de 2004.

O ofício, datado de 06/10/2005, é encontrado em uma série de folhas dos autos, dentre elas as fls. 354/356. Nele é possível perceber uma série de características exigidas ao veículo, quais sejam: a) ano de fabricação 2005 e de modelo 2005 ou 2006; b) bicombustível; c) cor preta; d) cinto de segurança traseiro central subadominal; e) maçanetas internas cromadas; f) manopla de câmbio com detalhe cinza; g) rodas de aço estampado 15 polegadas 6jx 15; h) pneus radiais 195/60/R15; i) destravamento automático das portas em caso de acidentes; j) direção com sistema de proteção contra impactos; k) pedais desarmáveis em caso de colisão; l) vidros verdes; m) direção hidráulica; n) ar condicionado; o) trio elétrico; p) mostrador digital e q) computador de bordo.

Em auditoria das contas municipais, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo apontou para irregularidades no procedimento mencionado, concluindo que "de forma implícita o certame restringiu e frustrou o caráter competitivo da licitação, favorecendo e beneficiando uma marca específica, afrontando o caput, § 1º, inc.I, do artigo 3º da Lei 8666/93 atinente aos princípios da legalidade, igualdade e da economicidade, bem como do art. 15, § 7º, inc. I do mesmo diploma legal" (fl. 56).

A auditoria deu ensejo a instauração de Inquérito Civil Público nº 25/07, onde o Executivo Municipal local reconhece, em seus esclarecimentos prestados, que "realmente, havia outros veículos poderiam atender as especificações, alguns de forma total, outros de forma parcial" enumerando algumas opções e ressaltando que "a opção flex viabiliza maior economia no abastecimento, sendo descartados os veículos que não atenderiam tal requisito" e que "ao final de 2005, dos veículos sedan, total flex, com itens de série requeridos pelo Presidente da Câmara Municipal, a marca GM oferecia o menor preço". Mais adiante "foram convidadas empresas potencialmente em condições de efetuar o fornecimento do veículo com as especificações solicitadas pela autoridade legislativa" (fls. 215/219).

No âmbito da licitação, em resposta à Carta Convite, a concessionária Chevrolet local, Francovel, acenou com proposta de veículo atendendo a todos os requisitos descritos, pelo valor de R$ 48.300,00. Outras concessionárias da marca também responderam à solicitação, assim como a própria General Motors do Brasil, sendo esta última a vencedora do procedimento pelo preço final de R$ 47.964,55 (fls. 303/305). Registro que a venda do veículo pela montadora foi realizada através de sua representante local e também licitante, Francovel.

Neste feito, da análise da prova documental produzida, é possível perceber que nenhuma das montadoras oficiadas por solicitação do parquet possuíam è época da licitação veículos capazes de atender todos os requisitos descritos.

Para a Fiat, o motor bicombustível, as maçanetas internas cromadas, a manopla de câmbio com detalhe cinza e os pedais desarmáveis em caso de acidente eram características inexistentes em seus veículos (fls. 696/697).

Já a Ford não possuía veículo com motor bicombustível, com destravamento automático das portas em caso de acidentes e com pedais desarmáveis em caso de colisão (fls.704/705).

A Volkswagem demonstrou incapacidade de atender ao motor bicombustível, às manoplas de câmbio com detalhe cinza, às rodas de aço estampado 15" 6jx 15, ao destravamento automático das portas em caso de acidentes e ao computador de bordo (fls. 719/720).

Renaut limitou-se a informar que os veículos com computador de bordo não possuíam rodas de aço, mas sim rodas de liga leva, o que lhe impossibilitava de atender as especificações da licitação (fls. 761/766).

Por fim Peugeot Citroën esclareceu que à época seus veículos não contavam com maçanetas cromadas, manoplas de câmbio com detalhe cinza, pneus 195/60, destravamento automático das portas em caso de acidente, direção com sistema de proteção contra impactos e pedais desarmáveis em caso de colisão (fls. 786/787).

Os demais veículos que, segundo informou a Municipalidade no Inquérito Civil preenchiam total ou parcialmente os requisitos exigidos, eram de fato mais caros à época da licitação, segundo a consulta juntada (fls. 316/318).

Consequentemente, a única conclusão possível diante de toda a extensa prova documental produzida é a de que efetivamente os requisitos exigidos no certame restringiram o objeto da licitação para um único modelo, de uma única montadora que, entretanto, foi ofertado por mais de uma concessionária autorizada.

Lembro que a presente ação busca perquirir sobre a prática de ato de improbidade administrativa que atente contra os princípios da administração pública, cuja definição, segundo o artigo 11 da Lei 8.249/92 "Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: [...]"
E para se analisar a conduta dos réus, consigno que nos termos do artigo 3º, § 1o, da Lei 8.666/93, "É vedado aos agentes públicos: I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991".

Sobre isso, anoto que o dispositivo mencionado expressa um dos princípios basilares que sustentam a Administração Pública e reporto-me à lição de Antônio Bandeira de Mello, para quem "O princípio da igualdade implica o dever não apenas de tratar isonomicamente todos os que afluírem ao certame, mas também o de ensejar oportunidade de disputá-lo a quaisquer interessados que, desejando dele participar, podem oferecer as indispensáveis condições de garantia. É o que prevê o já referido art, 37, XXI, do Texto Constitucional. Aliás, o §1º do art. 3º da Lei 8.666 proíbe que o ato convocatório do certame admita, preveja, inclua ou tolere cláusulas ou condições capazes de frustrar ou restringir o caráter competitivo do procedimento licitatório e veda o estabelecimento de preferências ou distinções em razão da naturalidade, sede ou domicílio dos licitantes, bem como entre empresas brasileiras ou estrangeiras, ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o objeto do contrato" (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 17. ed. 2004. p. 73-74).

Em contrapartida, registro que para se aferir se de fato a exigência afronta a disposição legal e, por consequência, o pórtico da igualdade, há que se observar se as exigência se justificam, se são úteis, necessárias, razoáveis. Para Hely Lopes Meirelles, o princípio da razoabilidade também pode ser denominado de princípio da proibição do excesso, e tem por fim “aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo. 29. ed. 2004. p. 92).

Portanto, cabe aqui decidir se as especificidades dos requisitos que ensejaram a restrição do objeto do certame eram de fato justificáveis, ou se, por outro lado, foram utilizados com a intenção de favorecer a multinacional vencedora.

E sobre isso, embora se reconheça que uma parcela significativa dos itens exigidos de fato são razoáveis – dentre eles o motor bicombustível, justificado pela municipalidade em seus esclarecimentos nos autos do Inquérito Civil – é evidente que em contrapartida vários itens exigidos mostram-se injustificáveis, seja pelo seu caráter decorativo, seja pela ausência de comprovação de utilidade imprescindível para o uso a que se destina, dentre as quais é possível destacar as maçanetas internas cromadas, a manopla de câmbio com detalhe cinza, rodas de aço estampado 15 polegadas 6jx 15, pneus radiais 195/60/R15, vidros verdes, mostrador digital e computador de bordo.

Ou seja, não há como se admitir ou reconhecer que o acabamento da maçaneta, a cor do câmbio, o material e tamanho da roda e dos pneus, a cor do vidro e a tecnologia do painel interferissem no uso a que o veículo se destinava, o qual, segundo consta no próprio ofício encaminhado pelo corréu Adiovaldo, era "para uso da Presidência, que em face da representatividade, tem inúmeros compromissos administrativos e outros correlatos" (fl. 354).

É evidente, outrossim, que as características exigidas, por sua especificidade, restringiram o objeto da licitação de tal forma que somente um único modelo poderia lhes atender de maneira satisfatória. Além do mais, é importante asseverar que boa parte dos itens descritos reproduzem o texto do próprio cartão publicitário de divulgação do veículo adquirido (fl. 291), tudo a demonstrar que as exigências já foram incluídas sabendo-se qual o veículo que seria capaz de atende-las.

Nessa linha, aliais, é possível concluir pela presença do elemento subjetivo doloso na conduta dos réus, já que todo o processo licitatório, ao que tudo indica, derivou de solicitação do chefe do legislativo municipal, que já apontava para o veículo a ser adquirido e que foi regularmente processada e homologada pela autoridade máxima do executivo municipal, ambos aqui processados.

Em outras palavras, é possível afirmar que na teoria o objeto da licitação era a aquisição de um veículo para uso da Presidência da Câmara Legislativa e, ao revés, na prática, a solicitação legislativa e o procedimento administrativo processado pelo executivo visavam a aquisição de veículo específico, com marca e modelo implicitamente determinados em razão das específicas e desarrazoadas características exigidas.

Assim, tanto o réu Adiovaldo como o corréu Márcio praticaram ato vedado aos agentes públicos pela Lei 8.666/93, prevendo e incluindo – o primeiro, admitindo e tolerando – o segundo, nos atos de convocação, condições que comprometeram, restringiram e frustaram o caráter competitivo da licitação, estabelecendo preferências impertinentes e irrelevantes para o objeto do contrato.

Em consequência, ofenderam diretamente os princípios da igualdade, impessoalidade, finalidade e moralidade, violando também os deveres de honestidade e imparcialidade, conduta que se amolda perfeitamente a definição de ato de improbidade administrativa trazida pelo artigo 11 da Lei 8.249/92.

Portanto, configurada a prática de ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública, de rigor a aplicação das sanções legais que, nos termos do artigo 12, III, da Lei 8.249/92, traduzem-se em "ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos", as quais podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do ato ou fato.

Ante o exposto e pelo mais que dos autos consta JULGO PROCEDENTE a presente Ação Civil Público por Ato de Improbidade Administrativa que Atenta contra os Princípios da Administração Pública, movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra Márcio Cecchettini e Adiovaldo Aparecido de Oliveira, e o faço para CONDENAR cada um dos réus a perda da função pública que exerçam, a suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco) anos, ao pagamento de multa civil equivalente a 100 (cem) vezes o valor das respectivas remunerações percebidas à época devidamente atualizadas à data do pagamento, e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de 03 (três) anos.

Em consequência, JULGO EXTINTA a ação, com resolução do mérito, nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo Civil.

Custas pelos Réus.

Deixo de fixar condenação em honorários advocatícios vez que estes não são devidos ao Ministério Público por expressa vedação constitucional contida no artigo 128, § 5º, II, a, da CF/88, aplicando-se o artigo 18 da Lei 7.347/85.

Anote-se a interposição do do agravo retido de fls. 676/679 na contracapa dos autos.

P.R.I.C.

Franco da Rocha, 18 de janeiro de 2016.


Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 0011763-11.2008.8.26.0198 e código 5I0000000RHWP.

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