Juiz(a) de Direito: Dr(a). Raul Márcio Siqueira Junior
Vistos.
Trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa com pedido liminar de indisponibilidade de bens proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, contra MÁRCIO CECCHETTINI, MARCELO TENAGLIA, MÁRCIO ANZELOTTI, SANDRO FLEURY BERNARDO SAVAZONI, ALESSANDRO MACHADO MATHIAS, CECAM CONSULTORIA ECONÔMICA, FRED ANDERSON SCANDIUZZI. Em síntese, alega que durante os dois mandatos de MÁRCIO CECCHETTINI como Prefeito (2005-2008, 2009-2012), foi implementado um abrangente esquema de desvio de verbas públicas na Administração Municipal, segundo o apurado, CECCHETTINI, por meio de seus Secretários, recebia de praticamente todos os fornecedores do Município parcela dos valores auferidos com a execução de contratos licitados de forma fraudulenta, na divisão de tarefas da organização criminosa, MARCELO TENÁGLIA, então Secretário de Governo, recebia a propina das empresas envolvidas e, após a contabilização das receitas ilícitas arrecadadas, as distribuía entre os diversos agentes públicos participantes. Os valores ainda eram destinados a Vereadores, que recebiam parcelas mensais. Tais fatos foram descobertos no bojo do PIC 09/09, após denúncias que lastrearam pedido de busca e apreensão nos Gabinetes da cúpula da organização criminosa. A farta documentação apreendida embasou a propositura da ação civil pública por ato de improbidade administrativa nº 0019818-14.2009.8.26.0198 (nº de ordem 01/10), que tramita perante a 2ª Vara Cível da presente Comarca. Apesar da documentação apreendida ser indiciária da participação de praticamente todos os fornecedores da Prefeitura no esquema de corrupção, incluíram-se no polo passivo daquela ação civil apenas as empresas contra as quais o lastro probatório se apresentava mais robusto, evitando-se, com isso, lides temerárias. Alega mais, que desde 2009, a requerida CECAM já constava da contabilidade informal da organização criminosa como pagadora de propina, a dcumentação arregimentada na peça de informação anexa permite concluir que a requerida continuou enriquecendo ilicitamente à custa do erário público, mesmo depois de deflagrada a operação supracitada. Na divisão de tarefas da organização criminosa, MARCELO TENÁGLIA, então Secretário de Governo, recebia a propina das empresas envolvidas e, após a contabilização das receitasilícitas arrecadadas, as distribuía entre os diversos agentes públicos participantes. Os valores ainda eram destinados a Vereadores, que recebiam parcelas mensais - mensalão em troca do seu apoio político ao Chefe do Executivo. O esquema de desvio de verbas vinculadas da educação infantil e fundamental teve início com a requisição de sistema de software desnecessário pelo então Secretário da Educação, MÁRCIO ANZELOTTI. A tramitação interna da requisição do serviço contou com a aprovação de MARCELO TENAGLIA Secretário de Governo, e de SANDRO FLEURY BERNARDO SAVAZONI Secretário de Assuntos Jurídicos, bem como do então prefeito MÁRCIO CECHETTINI. No mais, conforme restou constatado pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TC-001517/026/12), a CECAM não implantou sistema informatizado na Secretaria da Educação, muito menos treinou funcionários ou garantiu a manutenção dos sistemas inexistentes. Desta forma, FRED ANDERSON SCANDIUZZI celebrou contrato administrativo simulado com a Prefeitura Municipal de Franco da Rocha, obrigando-se a fornecer serviço que nunca seria prestado, com o único e exclusivo objetivo de desvio. Posteriormente, a CECAM, por meio de seu representante, acima mencionado, emitiu notas fiscais frias, atestando a prestação de serviço inexistente, observa-se que, não obstante a ausência da prestação do serviço contratado, mas de forma a dar ares de legalidade à contratação em comento, o servidor ALESSANDRO MACHADO MATHIAS declarou, no verso das notas fiscais apresentadas pela CECAM, que recebeuem ordem e na quantidade devida os materiais descriminados na Nota Fiscal(sic fls. 292/401 da PÇINFOR 66.0268.0000226/2017-0).
Por fim, com base exclusivamente nestas declarações e sem exigir qualquer processo de medição dos serviços contratados, MÁRCIO CECHETTINI e MARCELO TENAGLIA pagaram à CECAM a quantia de R$ 978.084,93 (novecentos e setenta e oito mil, oitenta e quatro reais e noventa e três centavos), por serviços que nunca foram prestados. Requer o autor em sede liminar a indisponibilidade dos bens dos requeridos, com base no artigo 12 da Lei nº 7.347/85, e no artigo 7º e parágrafo único da Lei nº 8.429/92; a notificação dos Requeridos para, querendo, oferecerem manifestação por escrito no prazo de 15 dias (providência a ser determinada com base no art. 17 e parágrafos da Lei 8.429/92); a Citação para contestarem no prazo legal; a intimação do Município de Franco da Rocha para conhecimento da presente pretensão e manifestação acerca de sua intervenção no feito, nos termos do artigo 17, § 3º, da Lei 8.429/92 c/c artigo 6º, § 3º, da Lei 4.71765; e por último a procedência da ação condenando todos os demandados como incursos no artigo 9º, inciso X, da Lei nº 8.429/92, às penas previstas no inciso I, do artigo 12 da Lei 8.429/92. Deu-se o valor da causa o importe de R$ 978.084,93. Com a inicial vieram os documentos fls. 20/17 a 386.
Diante da existência de pedido de concessão de liminar, passo a sua análise do pedido antes mesmo da notificação prévia do réu, não importando essa providência em irregularidade procedimental (STJ 2ª Turma, REsp 1163499/MT, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, j. 21/09/2010, DJe 08/10/2010), mesmo porque, diante da natureza dessa pretensão, a oitiva preliminar muito possivelmente a tornaria inócua.
A partir da análise dos argumentos deduzidos na inicial, à luz de toda a documentação a ela anexada e das regras constitucionais e infraconstitucionais aplicáveis à espécie, verifica-se neste momento não ser possível a decretação da indisponibilidade de bens com o recebimento da petição inicial de ação de improbidade administrativa quando ainda não se demonstrou que os demandados tivessem praticados, ou tentado praticar, atos visando onerar, dilapidar ou alienar seus bens, ou parte deles, no intuito de dificultar ou impossibilitar eventual ressarcimento futuro ao erário. Isso porque é indispensável que o pedido de constrição demonstre a presença concomitante dos dois requisitos típicos dessa modalidade de tutela, a saber, o "fumus boni juris" e o "periculum in mora".
A demonstração do "periculum in mora", por se tratar de requisito de natureza essencialmente factual, não se pode ter por configurada com a só aceitação da petição inicial. O perigo não pode ser presumido, exige-se que se revele por meio de indícios confiáveis. O perigo da demora não pode ter como fundamento a gravidade do fato alegado na inicial, que sequer restou comprovado, havendo com essa interpretação uma distorção do instituto, que se ampara em provas concretas acerca do risco da demora na prestação jurisdicional, ou seja, em evidências veementes de que o acusado está tentando dilapidar seu patrimônio. Deve-se promover a segurança jurídica e impedir que sejam cometidos excessos ou condutas imoderadas, invocando-se o princípio da razoabilidade para deferimento de cautelar de indisponibilidade de bens.
Com efeito, o deferimento da indisponibilidade de bens do acionado, antes de concluído o processo de apuração do ilícito, não deve ser praticado à mão larga, sob o impacto do pedido do Ministério Público que alegadamente tenha sofrido a lesão ou dano - ainda que de monta - ou sob a pressão da mídia, para aplacar resposta que a sociedade justamente exige, mas há de se pautar na verificação criteriosa da sua necessidade. A constrição de bens não deve ser entendida como se fosse sanção patrimonial antecipada do Agente Público, mas sim cautela processual, e que é da natureza das medidas cautelares a prévia demonstração da sua necessidade, conforme estabelecem os arts. 798 do CPC, 7o. da Lei 8.429/92 e 12 da Lei 7.347/85.” Trecho do Voto do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho (STJ; REsp 1.264.707; Proc. 2011/0159850-1; BA; Primeira Turma; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; DJE 04/02/2016).
Ante o exposto INDEFIRO o pedido liminar de a indisponibilidade dos bens dos requeridos.
Notifique-se os requeridos para, querendo, oferecerem manifestação por escrito no prazo de 15 dias (providência a ser determinada com base no art. 17 e parágrafos da Lei 8.429/92).
Após, com ou sem a apresentação da peça de defesa, tornem-me os autos conclusos para fins de cumprimento do disposto nos §§ 8º e 9º daquele dispositivo.
Por mandado, intime-se o Município de Franco da Rocha para conhecimento da presente pretensão e manifestação acerca de sua intervenção no feito, nos termos do artigo 17, § 3º, da Lei 8.429/92 c/c artigo 6º, § 3º, da Lei 4.71765.
Ante ao indeferimento da liminar, por ora fica prejudicado o pedido de deposito requerido as fls. 392/395.
Fls. 396/397: anotem-se os nomes dos procuradores da requerida CECAM – CONSULTÓRIA ECONÔMICA CONTÁBIL E ADMINISTRATIVA MUNICIPAL LTDA , os advogados: Ivan Barboza Rigolin – OAB/SP n. 64.974 e Gina Copola – OAB/SP n.140.232.
Intime-se.
Franco da Rocha, 07 de junho de 2018.
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